Resenha crítica do livro “As impacientes”, Djaïli Amadou Amal, Ed. Imã.
Este livro conta a história de três mulheres camaronesas: Ramla, Hindou e Safira. Ramla e Hindou são adolescentes que têm seus casamentos arranjados pela família e Safira, uma mulher de 35 anos, seis filhos, sofre ao ter que dividir seu marido com Ramla.
Ramla, que sonhava em fazer faculdade de Farmácia, deixou seus estudos para ser a 2ª esposa de um homem mais velho e passou por momentos difíceis com Safira, que lutou com todas as armas que tinha para separar Ramla de seu marido. Hindou, a doce e jovem meia-irmã de Ramla foi forçada a se casar com o primo alcoólatra que a humilha, espanca e estupra cotidianamente. Todo mundo sabe, todo mundo vê, mas se o marido faz o que faz, “é porque ela merece”.
Além das histórias destas mulheres, o livro traz como pano de fundo a vida de uma concessão, onde as mulheres estão em segundo plano, mas são as responsáveis pelo funcionamento, organização e logística da vida de todos os homens, da criação dos filhos e dos afazeres domésticos, mas seguem uma hierarquia tão rígida que não permite que estas mulheres se comuniquem e conversem entre si, pois são criadas para competirem umas com as outras e para não demonstrarem as suas fragilidades para as outras mulheres. Filhas são ensinadas a terem paciência, único consolo que recebem das mulheres mais velhas para suportar a dor e fazer seus homens felizes, como ordena Alá.
Djaïli Amadou Amal denuncia em seu livro como vive a sociedade camaronesa quando nos fala da poligamia, da família e dos arranjos do parentesco, do lugar de poder do homem na sociedade e na família, dos casamentos forçados, de uma vida sem sonhos e dedicada ao marido e filhos, do estupro conjugal, da violência e da agressividade com suas esposas e como os corpos dóceis destas mulheres são submetidos aos ditos do patriarcado em nome da religião e da política.
Não tão longe, aqui mesmo em nosso círculo, é possível ver quantas mulheres ainda se submetem (são submetidas?) a vivências muito parecidas com as do livro, com a ressalva que em Camarões, o homem é investido de poder institucionalmente e aqui no Brasil, a cultura machista e patriarcal dá subsídio ao homem de ser violento e agressivo com a mulher pela força e pela falta de leis que protejam os seus direitos e suas vidas.
“Munyal!”, termo fulani que significa “no fim da paciência se encontra o céu”, sempre trazido no texto como uma espécie de mantra para suportar as suas existências, pondero que céu seja este. Foi preciso pedir paciência para continuar a leitura e perceber ser tão difícil de acreditar que em pleno século XXI mulheres ainda paguem sua existência com seu corpo em carne viva e sem tanta expectativa de sonhar com mundo diferente deste inferno que não podem escapar.
Ficha técnica:
Título: As Impacientes
Autora: Djaïli Amadou Amal
Editora: Ímã Editorial
Ano de publicação: 2022 (págs: 218)
Sinopse: o livro narra as histórias de três mulheres, Ramla, Safira e Hindou, que sofrem com casamentos forçados, poligamia e violência doméstica, enfrentando a submissão sob o conselho ancestral de "paciência". O livro aborda de forma urgente as dificuldades e os choques violentos na vida de mulheres que vivem em um contexto machista, sendo uma leitura sobre direitos femininos no Sahel, na África.
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